A Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro vai solicitar a complementação do boletim de ocorrência dos jovens roubados e torturados por policiais militares (PMs) na madrugada de Natal (25), em Santa Teresa, no Rio de Janeiro.
O documento, registrado pela Polícia Civil, não inclui a prática de tortura, crime hediondo e inafiançável, e classifica as agressões apenas como lesão corporal. Segundo o relato dos jovens, que têm entre 13 e 23 anos, eles foram ameaçados, humilhados, feridos com faca e isqueiro no meio da rua, onde também tiveram que ficar nus e praticar sexo oral. A pena para torturadores é de oito anos de cadeia, podendo ser aumentada se a prática for contra criança ou adolescente ou cometida por agente público.
A solicitação para que a tortura passe a constar do boletim de ocorrência do caso será feita pelo presidente da comissão, deputado Marcelo Freixo (Psol), ao Ministério Público Estadual. Freixo recebeu hoje (5) duas vítimas e a mãe de outra do mesmo grupo, para prestar apoio.
Os adolescentes saíram do gabinete do deputado sem falar com a imprensa. Segundo Freixo, eles estão com “pânico” de sofrer retaliação por terem denunciado os policiais, como já ocorreu em outros casos. Os oito PMs envolvidos foram presos preventivamente e agora prestam serviços internos. Um inquérito policial militar está em andamento e deve ser concluído em até 60 dias.
A Comissão de Direitos Humanos da assembleia também recebeu a estudante de comunicação Michelle*, que denunciou policiais do Batalhão de Operações Especiais (Bope) por estupro, também no dia de Natal, na Rocinha, na zona sul do Rio. Muito abalada, ela disse que não foi a única vítima dos policiais que a violentaram e que outras mulheres têm medo de denunciá-los.
“Cadê as outras meninas que foram agarradas, puxadas para dentro de becos, as meninas que sambaram no caco de vidro, cadê todo mundo? Não apareceu ninguém e não vai aparecer [por medo]”, disse, destacando o fato de a denúncia envolver policiais da força especial. “Quando eu descrevi a farda deles [na delegacia] parecia que estava denunciando Jesus Cristo”, contou. “Mais quantas vezes isso vai acontecer sem que ninguém faça nada?”, questionou.
Freixo encaminhou a jovem para tratamento psicológico e aproveitou para condenar a divulgação de um vídeo com a estudante “abalada”, como a própria Michelle reconheceu, vazado para imprensa e exibido na internet e em emissora de televisão. “Foi uma tentativa de desqualificar a vítima, de maneira irresponsável pela TV”, avaliou o deputado. Nas imagens, a estudante aparece discutindo com policiais, próximo ao local onde foi estuprada por outros dois homens. “Claro que eu estava transtornada, ainda não consegui encontrar minha paz”, desabafou a jovem, que teve os sinais de violência sexual confirmados em exame do Instituto Médico Legal.
De acordo com o deputado Marcelo Freixo, as frequentes trocas de comando da Polícia Militar dificultam a implementação de mudanças na corporação. Ele explicou que, por meio da comissão, acompanhará o andamento das investigações dos dois casos. A Defensoria Pública também será acionada para monitorar desdobramentos nas esferas civil e criminal.
“Chegamos a um ponto absurdo em que temos de dizer o óbvio à polícia: não pode torturar, não pode estuprar, não pode assaltar e não pode assediar”, afirmou. – BRASIL EM FOLHAS COM AGÊNCIAS DE NOTÍCIAS – I3D 944