O médico Laurent Lantieri, especialista em transplante facial, posa ao lado de fotos com os três diferentes rostos do paciente Jérôme Hamon em Paris, na França, 13 de abril de 2018
Jérôme Hamon teve três rostos durante a vida. Depois do fracasso de um primeiro transplante, realizado por causa de uma doença genética, sofreu outra operação desse tipo em janeiro, e agora aprende a viver com sua nova identidade.
O francês, de 43 anos, que continua hospitalizado três meses depois de sua operação em Paris, é a primeira pessoa no mundo submetida a dois transplantes de rosto.
Por enquanto, seu rosto permanece liso e imóvel e não se ajusta à forma de seu crânio, mas seu aspecto deve melhorar aos poucos, contanto que funcione o tratamento imunossupressor para impedir uma nova rejeição do enxerto.
Me sinto muito bem, disse Hamon em um encontro com a imprensa na semana passada. Tenho pressa para me livrar disso tudo, acrescentou, falando com dificuldade e cansado pelo forte tratamento que recebe.
A façanha dessa segunda operação foi obra da equipe de Laurent Lantieri no hospital parisiense Georges-Pompidou.
Em 2010, esse cirurgião plástico já tinha realizado um primeiro transplante completo de rosto no mesmo paciente, no hospital Henri-Mondor de Créteil, perto de Paris.
Hamon sofre de uma neurofibromatose de tipo 1, conhecida como doença de von Recklinghausen, um transtorno genético que deformou seu rosto.
– Verme marinho –
O primeiro transplante foi um sucesso, contou Hamon em um livro publicado em abril de 2015: Tas vu le Monsieur? (Você viu esse senhor?).
Infelizmente, nesse mesmo ano, ele utilizou um antibiótico incompatível com seu tratamento imunossupressor para curar um simples resfriado. Em 2016, começou a mostrar sinais de rejeição crônica e seu rosto piorou.
Precisou ser hospitalizado em meados de 2017, e em novembro, os médicos retiraram o rosto enxertado, devido ao aparecimento de zonas necrosadas.
Permaneceu dois meses sem rosto no hospital Pompidou, à espera de que a agência francesa de biomedicina encontrasse um doador compatível. Foram momentos dolorosos que não acabaram com a vontade de lutar de Hamon.
Toda a equipe de recuperação ficou impressionada com a coragem de Jérôme, sua vontade, sua força em uma situação trágica. Porque então estava em uma situação de espera e nunca se queixou. Pelo contrário, tinha bastante bom humor, contou à imprensa Bernard Cholley, anestesista do Georges-Pompidou.
O doador foi um homem de 22 anos, falecido a centenas de quilômetros de Paris. Lantieri ficou sabendo disso no domingo 14 de janeiro. Um dia depois, o rosto do jovem foi retirado e trasladado ao hospital.
Com o consentimento da agência francesa de segurança dos medicamentos, foi utilizada uma técnica revolucionária para conservar o enxerto. Em vez de introduzir o rosto em uma solução clássica, usou-se hemoglobina de vermes marinhos para reter o oxigênio.
– Sou eu –
Jérôme Hamon entrou na sala de cirurgia na segunda-feira 15 de janeiro. Ao meio-dia, a equipe médica começou a preparar os vasos sanguíneos e os nervos do paciente para poder fazer o transplante, explicou Lantieri.
Depois, foi como colocar uma máscara com cuidado, unindo-a a tudo que compõe a anatomia complexa da cabeça. O enxerto rapidamente ganhou cor.
Hamon saiu do centro cirúrgico na terça-feira de manhã, após uma operação extraordinária.
A operação responde à pergunta (…): é possível fazer um segundo transplante de rosto? Sim, é possível, e isto é o que se obtém, disse Lantieri.
Para evitar uma rejeição, foi preciso retirar os anticorpos do sangue com uma plasmaferese e bloquear a produção desses anticorpos com um tratamento medicamentoso durante os três meses anteriores ao transplante, explicou o nefrologista Éric Thervet.
Após o primeiro transplante, aceitei imediatamente o enxerto. Considerei-o um novo rosto, e agora é a mesma coisa, assegurou Hamon. Se não tivesse aceitado esse novo rosto, teria sido um drama. Efetivamente, é uma questão de identidade (…) Mas agora está bom, sou eu.
Foram realizados 40 transplantes de rosto no mundo desde o primeiro, o da francesa Isabelle Dinoire, em 2005.
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