É um tanto inevitável buscar paralelos entre 1993, quando se passa o longa “Real – O Plano por trás da História”, e a crise econômica, social e política que o Brasil atravessa no presente. Mas também é infrutífero querer nivelar os dois momentos pela mesma régua.
Dessa forma, o filme de Rodrigo Bittencourt (“Totalmente inocentes”) força o bonde da história na tentativa de buscar ecos do passado no presente –especialmente numa menção um tanto artificial ao juiz Sérgio Moro já perto do final da trama.
Ao centro de “Real” está o economista Gustavo Franco, uma espécie de anti-herói arrogante, grosseiro e megalomaníaco que transforma num ato de resistência aguentar os poucos mais de 90 minutos protagonizados por tal personagem, interpretado por Emilio Orciollo Netto.
Trabalhando com um roteiro de Mikael Albuquerque –escrito a partir do livro “3.000 Dias no Bunker”, de Guilherme Fiuza–, Bittencourt vê a equipe econômica que criou o Plano Real, em meados dos anos de 1990, como uma espécie de gângsters descolados da economia –a cena deles andando de óculos escuros em câmera lenta parece saída de “11 Homens e um Segredo–, renegados a uma espécie de porão em Brasília, com suas ideias para salvar o país da crise, capitaneados por Fernando Henrique Cardoso (Norival Rizzo), na época ministro da Fazenda.
É bem verdade que o roteirista e o diretor tentam injetar algum ânimo a uma trama que se baseia em gente discutindo economia de forma didática e acessível. Dessa forma, tudo acaba meio raso, e o que domina é a figura de Gustavo, cuja trajetória é o fio condutor da narrativa.
Nesse sentido, “Real” transforma-o num mártir da modernidade, sacrificando sua vida pessoal, impulsionado pelo seu ego gigantesco para criar o plano econômico e protegê-lo de qualquer pessoa que seja uma ameaça contra sua cria.
Outras figuras reais entram e saem de cena sem deixar muita marca –como Pedro Malan, interpretado por Tato Gabus Mendes; Pérsio Arida, no filme, maior desafeto de Gustavo dentro da equipe, e feito por Guilherme Weber; e José Serra, que esnoba com gosto o economista e é vivido por Arthur Kohl.
Mas o melhor personagem desse grupo é mesmo Itamar Franco, no filme representado por Bemvindo Siqueira. Com seu topete infalivelmente descabelado, o ex-presidente (em sua versão do cinema), sempre preocupadíssimo com os pobres do Brasil, é o alívio cômico em meio a um filme que desperta mais risinhos amarelos do que simpatia.
Há também personagens totalmente fictícios que condensam em si algumas questões –como a assessora pessoal de Gustavo, Denise (Mariana Lima), que, em alguns momentos, funciona como um pêndulo moral. Mas o mais interessante, embora apareça pouco, é um político do PT, interpretado por Juliano Cazarré, cujo sotaque caipira nunca faz muito sentido. Primeiro, aparece como aliado de FHC, pedindo o seu apoio. Depois, mais para o final, é motivo de chacota de Gustavo, quando este depõe numa CPI.
“Real – O Plano por Trás da História” é pobre em suas caracterizações, tem ritmo irregular e uma trilha sonora insuportavelmente onipresente, assinada pelo diretor e Maycon Ananias. E acaba sendo tão inócuo como cinema tanto quanto como releitura da história. – BRASIL EM FOLHAS COM AGÊNCIAS DE NOTÍCIAS – I3D 32466